Não resisti:
«Após alguma reflexão sobre o assunto, ocorreu-me que talvez fosse
importante que alguém apresentasse Vítor Gaspar a um ser humano. Podia
ser um encontro discreto, a dois, só com um terceiro elemento que
começasse por fazer as honras: "Vítor, é o ser humano. Ser humano, é o
Vítor." E depois ficavam a sós, a conviver um bocadinho.
Perspicaz como é, o ministro haveria de reparar que, entre o ser humano e
um algarismo, há duas ou três diferenças. O ser humano comparece com
pouca frequência nas folhas de excel, ao contrário do algarismo. E o
algarismo não passa fome nem morre, ao contrário do ser humano. É raro
encontrarmos uma lápide, no cemitério, com a inscrição: "Aqui jaz o
algarismo 7. Faleceu na sequência de um engano numa multiplicação. Paz à
sua alma." Mal o ministro tivesse percebido bem a diferença entre o ser
humano e os números, poderia voltar às suas folhas de cálculo. Admito
que se trata de uma experiência inédita, mas gostaria muito de a ver
posta em prática.
Houve um tempo em que quem não soubesse de economia estava excluído da
discussão política. Felizmente, esse tempo acabou. Os que percebem de
economia são os primeiros a errar todos os cálculos, falhar todas as
previsões, agravar os problemas que pretendiam resolver. As propostas de
um leigo talvez sejam absurdas, irrealistas e inexequíveis. Não faz
mal: as do ministro também são. Estamos todos em pé de igualdade. A
realidade não aprecia economistas. Se um chimpanzé fosse ministro das
Finanças, talvez a dívida aumentasse, o desemprego subisse e a recessão
se agravasse. Ou seja, ninguém notava.
Como toda a gente, também tenho uma sugestão para reduzir a despesa.
Proponho que Portugal venda uma auto-estrada para o Porto. Temos três, e
não precisamos de todas. Há-de haver um país que esteja interessado
numa auto-estrada para o Porto. Não há nenhuma auto-estrada para o Porto
no Canadá, por exemplo. Nem na Noruega. (Eu confirmei estes dados.) São
países ricos, aos quais uma auto-estrada para o Porto pode dar jeito.
Fica a proposta. Não é a mais absurda que já vi.»
Ricardo Araújo Pereira, Visão, 29 Novembro 2012
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário